Imperícia, imprudência ou negligência no atendimento a um paciente são os fatores mais constantes na propositura de ações indenizatórias na Justiça e na abertura de processos ético-profissionais nos Conselhos Regionais de Medicina contra os médicos. Esses litígios estão crescendo e se tornando comuns nos dias atuais.
Talvez, um dos motivos que contribuem para o aumento dessas ações tenha sido o novo texto constitucional de 1988, que tornou viável a quantificação do valor correspondente à dor e ao sentimento daquele que se considera lesado em decorrência da má conduta médica ou até mesmo de uma insatisfação pessoal após tratamento médico.
Nos tribunais norte-americanos, ações indenizatórias por danos morais e materiais relacionadas à conduta do médico tramitam com muita frequência e apontam julgamentos impondo condenações que envolvem altos valores. De certa forma, o brasileiro está sendo estimulado a tomar essas iniciativas.
Assim, cresce o número de processos envolvendo médicos, principalmente aqueles que atuam em hospitais públicos, onde as condições de trabalho estão distantes do atendimento ideal. Os cirurgiões plásticos, muitas vezes comprometidos com o resultado estético do paciente, também são alvos em potencial de ações judiciais.
O atendimento médico prestado ao paciente estabelece um contrato, que se configura como uma obrigação de meio. Ou seja, o médico tem o dever de prestar ao paciente cuidados específicos e atentos, conforme os progressos da medicina, mas não a obrigação de curar o paciente.
Há casos, porém, que se supõe a obrigação de resultado, como ocorre na cirurgia estética, que visa a satisfação daquilo que se pretendeu. Outro exemplo é o contrato de hospitalização, no qual o médico assume o dever de preservar o enfermo de acidentes.
É necessário que o médico não ignore sua responsabilidade de natureza delitual nas situações em que pode cometer um ilícito penal ou violar normas regulamentares da profissão. Ele poderá responder a ação judicial ou mesmo a processo ético-profissional por queixa ou denúncia do paciente, situações em que caberão providências dos órgãos competentes.
O crescimento de ações e processos ético-profissionais traz a necessidade de estabelecer critérios legais para o atendimento aos pacientes. Algumas precauções são importantes, inclusive com a utilização de termos ou contratos, apesar de tornarem inconvenientes na relação médico-paciente.
É preciso enfatizar que o médico deve seguir, rigorosamente, as condutas estabelecidas no Código de Ética Médica e observar os meios técnicos aprovados pela literatura da sua especialidade. Conduta viável é esclarecer ao paciente de forma clara, simples e objetiva, sobre a doença ou o problema que ele apresenta, informando, da mesma maneira, os meios de encontrar a solução.
É possível que o paciente insatisfeito procure o médico antes de ingressar em Juízo ou denunciá-lo ao Conselho. Quando isso acontece, é importante que o médico esclareça ao paciente, em linguagem popular, o que e porque ocorreu o imprevisto. Se for o caso, deve propor corrigir sua falha.
Nessas circunstâncias, não se descarta a possibilidade de se fazer um acordo, muitas vezes sugerido pelo próprio paciente e com exigência pecuniária. Caso isto seja concretizado, é indicado que este acordo seja redigido sob a orientação de um advogado, que indicará a maneira mais correta de coibir nova solicitação indenizatória, desta vez na Justiça.
O médico que receber um mandado de citação em virtude de uma ação judicial ou uma notificação referente à abertura de processo ético-profissional, em decorrência de eventual erro num procedimento médico, deverá imediatamente procurar um advogado, a fim de ser orientado e defendido de forma juridicamente correta.
Os abusos cometidos pelos órgãos de mídia no exercício da liberdade de informação têm sido um tema recorrente entre os profissionais médicos. A Lei 5.250/67 garante a liberdade de manifestação do pensamento e da informação, garantia esta corroborada pela nossa Constituição Federal. Essa liberdade, porém, está delimitada por preceitos legais que visam coibir abusos contra a imagem e a honra das pessoas.
O paciente, diretamente ou por meio de seus familiares ou representantes legais, tem o direito de levar à apreciação do Poder Judiciário qualquer suposta lesão a direito ocorrida na relação médico-paciente. O que não pode haver é uma extrapolação no exercício desse direito, expondo a imagem e a reputação do médico em noticiários veiculados pela mídia impressa e televisiva.
Esse comportamento é passível de punição na esfera cível e criminal, por meio de medidas judiciais que visam proteger a imagem e a honra das pessoas. A própria Lei de Imprensa destinou um capítulo específico para tratar do tema, denominado "Dos abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e informação". Estão sujeitos às penalidades ali previstas os jornais, as publicações periódicas, os serviços de radiodifusão e os serviços noticiosos.
Vem se tornando prática comum nos meios de comunicação a divulgação de casos ainda não apurados envolvendo condutas médicas, aos quais se imprime um tom sensacionalista e acusador, acarretando aos profissionais envolvidos um prejuízo incalculável.
Os atos atentatórios contra a honra, consistentes em injúria, calúnia e difamação estão previstos como crime pelo Código Penal Brasileiro. A injúria é a ofensa contra a dignidade e o decoro da pessoa; já a difamação consiste em imputação de fato preciso, ofensivo à reputação da vítima; por último, a calúnia é a falsa imputação de crime.
Quando praticados por meio da imprensa, a legislação prevê a possibilidade de notificação judicial do responsável pela veiculação da matéria para que, no prazo de 48 horas, ofereça as explicações pertinentes. Nessa notificação, o ofendido poderá requerer ao juiz o exercício do direito de resposta ou a retratação, pelo mesmo meio de comunicação utilizado para a divulgação da ofensa.
Se o notificado se recusar a fazê-lo, responderá penalmente pela ofensa praticada. A ação penal deverá ser proposta dentro de 3 meses, contados a partir da data da publicação ou transmissão, sob pena de prescrição.
A apuração da responsabilidade criminal independe da responsabilidade civil por danos morais, podendo ser proposta, ainda, uma ação indenizatória contra o responsável pelos danos causados ao médico em virtude da divulgação dos fatos ofensivos.
Fontes: Roberto Augusto de Carvalho Campos, Rosmari Aparecida Elias Camargo e Departamento de Defesa Profissional da APM - Assessoria Jurídica
A Resolução CFM 1.638/2002
http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2002/1638_2002.htm define o prontuário médico como "o documento único constituído de um conjunto de informações, sinais e imagens registradas, geradas a partir de fatos, acontecimentos e situações sobre a saúde do paciente e a assistência a ele prestada, de caráter legal, sigiloso e científico, que possibilita a comunicação entre membros da equipe multiprofissional e a continuidade da assistência prestada ao indivíduo".
Pela sua própria definição, mencionando-se expressamente tratar-se de um documento "sigiloso" e também pelo seu conteúdo, contendo um conjunto de informações sobre o paciente, decorrentes diretamente da relação médico-paciente, podemos dizer que o prontuário é um dos componentes do segredo médico.
Esta opinião é já consagrada por inúmeras respostas às consultas junto ao CREMESP e CFM e enfatizada por suas assessorias jurídicas, que dizem: "O segredo médico, enquanto instituto jurídico, acolhe no seu bojo as papeletas, boletins médicos, folhas de observação clínicas e fichários respectivos que, assim, submetem-se ao regime penal e ético próprio que resguarda e tutela o sigilo profissional".
Parece inegável, em conclusão, que o prontuário integra o segredo médico, consistindo sua exibição a terceiros, sem a expressa autorização do paciente, violação a este dever ético e jurídico. Caso essa exibição acarrete danos materiais e morais ao paciente, este pode demandar judicialmente a responsabilização civil e penal do médico.
O sigilo profissional, tipificado nos arts. 73 a 79 do Código de Ética Médica http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2009/1931_2009.htm, está associado ao prontuário do paciente, que contém informações decorrentes da relação médico-paciente. Este segredo não pode ser divulgado a terceiros sem o expresso consentimento do paciente. O segredo médico é uma espécie do segredo profissional, consistindo no resultado de confidências que o médico receberia de seus pacientes, com o fim de poder prestar-lhe qualquer serviço atinente à sua profissão.
Tais confidências não se restringiriam, contudo, apenas àquelas manifestadas oralmente pelo paciente. Incluiriam também tudo que o médico observa e verifica, o que contempla por si e até o que descobre e que o doente não desejava revelar.
Decorreria o segredo médico do direito constitucional à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem, assegurado no inc. X, do art. 5º, da Constituição Federal, lei máxima de nosso País. Sua violação, além das indenizações morais e materiais a que daria ensejo ao paciente, também constituiria crime, nos termos do artigo 154 do Código Penal.
Por ser um desdobramento do direito à intimidade, o segredo médico pertence ao paciente, como vimos na manifestação do CREMESP em resposta à Consulta nº 1.272-42/80: "O segredo pertence, pois, ao paciente e o direito e a ética reprimem a conduta do profissional que injustamente o revele".
Assim, o segredo médico somente poderá ser revelado pelo profissional se este obtiver do paciente prévia autorização para tanto ou se a lei expressamente autorizar a revelação. Do contrário, haverá punição ética e jurídica.
Destacamos que este segredo está limitado ao paciente e ao médico ou à equipe médica que o assistiu. Não pode, em princípio, ser revelado nem mesmo a outros médicos sem a autorização do paciente ou da lei.
Muitas empresas administradoras de planos de saúde vêm propondo a seus médicos credenciados que constituam pessoa jurídica, ou seja, passem a prestar serviço como empresa.
A proposta relaciona-se com Lei Federal que tornou obrigatório o recolhimento, a cargo da empresa contratante, de 20% calculado sobre os valores pagos a pessoas físicas prestadoras de serviços em caráter eventual e sem relação de emprego. Anteriormente, o percentual a ser recolhido pela empresa contratante era de 15%. As administradoras dos planos de saúde, ao passarem a se relacionar com pessoas jurídicas, ficariam desobrigadas dos ônus do recolhimento em questão.
A imposição dessa conduta é que não encontra respaldo legal. Estando em vigor um contrato bilateral, não poderia ele ser alterado apenas por uma das partes. Há que se reconhecer, no entanto, estar implícito que o descumprimento dessa "solicitação" poderia desinteressar a respectiva administradora na continuidade do contrato de credenciamento do profissional.
No entanto, é necessário considerar que a proposta não é de todo ruim para os médicos. Toda vez que recebem pagamentos das administradoras dos planos de saúde na condição de pessoas físicas, os médicos são obrigados a alguns recolhimentos, sendo o imposto de renda o principal. Já ao se transformar em pessoa jurídica, o médico deve considerar gastos com a constituição da empresa, contratação de contador e os ônus dos recolhimentos mensais de tributos, entre os quais, a COFINS, PIS, INSS, IRPJ.
É importante, então, verificar vantagens e desvantagens em passar de pessoa física para jurídica. Um contador poderá ser de grande ajuda, fazendo os cálculos necessários para se chegar às conclusões mais adequadas
. A classe médica não pode perder de vista sua luta pela autonomia e liberdade de ação junto aos seus pacientes em virtude das imposições feitas pelas administradoras de planos de saúde. É importante que o médico tenha consciência dos gastos que terá caso constitua uma pessoa jurídica e, se não for esse seu desejo, o ideal é não ceder às exigências dos planos de saúde.
Qualquer ameaça de descredenciamento por parte das administradoras de planos de saúde deverá ser comunicada aos Departamentos de Defesa Profissional das Federadas da Associação Médica Brasileira (AMB), como a Associação Paulista de Medicina (APM), e estas deverão formalizar denúncia contra os diretores técnicos destas administradoras nos Conselhos de Medicina.